Perguntaram de certa feita a Agostinho: «Que é que desejas conhecer?» E ele retrucou: «Deus e a alma!» «Nada mais?» foi a exclamação de admiração de seu interlocutor. «Nada mais!» foi a resposta firme de Agostinho. Sim, o destino de uma alma se encontra em Deus, por intermédio de Cristo; e apenas tristeza e alienação têm sobrevindo aos homens que se desviam desse elevado alvo e expressão da vida. Pelo contrário, sempre que o nome de Cristo domina em verdade, o resultado inevitável é o regozijo. Na realidade existem imitações, porém, a mera imitação de Cristo não pode atrair os homens por longo tempo, e nem pode produzir aquela alegria profunda aqui aludida.
Nossos dias se caracterizam por um tempo demasiado, perdido na construção e na manutenção dessas imitações, infelizmente.
Qual será a natureza espiritual da alegria? Antes de tudo, ao nos referirmos à alegria, devemo-nos lembrar que a alegria autêntica é um dos aspectos do fruto do Espírito Santo, de conformidade com os ensinos de Gál. 5:22,23.
Juntamente com o amor e a paz, a alegria é um dos três frutos espirituais mencionados em primeiro lugar. A alegria, por conseguinte, resulta da influência celestial sobre nosso homem interior. Jamais poderá ser equiparada com aquilo que o mundo chama erroneamente de felicidade, porquanto esta depende das circunstâncias, e as circunstâncias são demasiadamente instáveis.
Em contraste com isso, a alegria verdadeira consiste em um sentimento constante de bem-estar, no íntimo, causado pelo ministério do Espírito de Deus, que transmite à alma o bem-estar de Cristo. Ora, esse bem-estar se fundamenta na imortalidade da alma, bem como em seu destino e transformação apropriados, segundo a imagem de Cristo. E isso é para nós um tesouro inestimável, como resultado natural da comunicação desse conhecimento a nós, o que nos propicia um sentimento de propósito, de gratidão e de bem-estar geral.
O Senhor Jesus proferiu as suas mensagens de despedida aos ouvidos de seus discípulos, conforme o registro dos capítulos catorze a dezessete do evangelho de João, visando o propósito de que se tomassem possuidores das três grandes manifestações do Espírito Santo - amor, alegria e paz. (Ver as notas expositivas acerca de João 14:21,23,27; 15:9-11 e 13:34).
Portanto, a alegria consiste também na formação da personalidade de Cristo em nosso homem interior. Acerca desse fato, diz Lange (in loc., comentando sobre o trecho de João 15:11): «Pois o domínio da personalidade de Cristo, nos corações de seu povo, não destrói, mas antes, vivifica, desenvolve e glorifica as suas personalidades. (Ver I João 1:4 e II João 12)». Ora, essa nova personalidade celeste (produto da regeneração contínua), apesar de ser individual, é, entretanto, a participação naquilo que Cristo é.
O filósofo Spinoza compreendeu muito bem esse princípio da alegria, ao escrever: «A bem-aventurança não é algo acrescentado à bondade, é a própria bondade». {Ética, parte V, proposição 42).
Clemente, um dos primeiros pais da igreja, disse: «A vida inteira se transformou em um cântico... orando, louvamos, e velejando, cantamos». (Miscelâneas, VII.7).
Hermas fala sobre o Espírito Santo, chamando-o de «Espírito feliz».
É digno de nota que o filósofo norte-americano William James, em sua obra Varieties of Religious Experiences, tenha devotado quase que a totalidade de sua segunda preleção à consideração da felicidade sem-par que uma fé religiosa sincera tende por conferir aos homens.
Campanella queixava-se de que a arte não tem conseguido retratar adequadamente a Cristo, porquanto, quase sempre, se tem concentrado na cena da crucificação, que ocupou apenas algumas poucas horas de sua vida terrena, da expressão da sua missão na terra, ao passo que Jesus foi O grande conquistador, O Salvador ressurrecto e vitorioso, e isso para sempre. (Ver soneto XXI, A Ressurreição).
As catacumbas dos cristãos primitivos de Roma descrevem muito melhor do que a arte dos pintores medievais e modernos, a expressão emocional da fé cristã; porque entre os desenhos ali encontrados, aparece o de Cristo, apresentado sob o simbolismo do Bom Pastor. Acerca dessa representação figurada de Cristo, escreveu o deão Arthur P. Stanley: «Apresenta-nos o lado jubiloso do cristianismo... Considere-se aquela figura bela e graciosa, a descer como que de suas colinas nativas, com a feliz ovelha aninhada em seus ombros, com a gaita pastoril em sua mão, a transandar uma juventude imortal... Esse é o conceito primitivo do fundador do cristianismo... a noção popular sobre ele (Cristo), na igreja cristã primitiva, era a de um jovem alegre, dotado de desenvolvimento eterno, de graça imortal». (Christian Institutions, Nova Iorque, Charles Scribner’s Sons, 1881, págs. 284-285).
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